quinta-feira, novembro 29, 2007

Experiências com a morte


Objectivamente, a pior experiência que já vivi, muito mais do que coisas amorosas ou relacionais, muito mais do que notas de faculdade ou problemas com os pais, foi quase ter sufocado até à morte. É, por muito que blogs EMO e gente propensa a lançar alertas de suicídio queria enraivecer os seus sentimentos, a segunda pior coisa que nos pode acontecer, apenas suplantada pelo acto efectivo de falecer.
Isto deu-se há uns anos, era um jovem já com pêlos no peito e tinha 15 anos. Numa caminhada nocturna que se deu numa actividade de escuteiros, fugíamos de um fogo, embora não fosse isso que me pusesse em perigo a vida. Quer dizer, se em vez de andarmos, tivéssemos ficado deitados, já era um caso diferente. Mas decidimos andar, atabalhoadamente, sem grande nexo. Isto, claro, deu alguma bronca. No meu caso, que estava desidratado, descambou para o pior. Nervoso, deu-me para vomitar. O problema é que o meu corpo estava em modo de escassez de líquidos, o que fez com que o vómito, perdoem-me o grafismo, ficasse preso na minha garganta. O resultado lógico, está claro, foi a minha total incapacidade em respirar. Para quem nunca experimentou, nem tente imaginar, porque não vale a pena. É cem vezes pior do que imaginam: a impotência em não conseguirmos fazer nada, a sensação de que podemos ficar ali e acabou e a cara das pessoas à nossa volta, cujo terror triplica o nosso. Não é bonito. Felizmente, um dos escuteiros que me acompanhava percebia uma ou duas coisas de primeiros socorros e aplicou-me com sucesso a manobra de Heimlich, provavelmente um dos únicos tipos alemães de que gosto a sério. Consegui expelir o monte de vómito duro e após ter bebido alguns goles de água, pude seguir o meu caminho, porque, enfim, dizem que o fogo pode queimar. Era uma teoria lançada na altura que ficou comprovada este ano na Califórnia.
Nunca me esqueci disto. Esperava nunca mais a repetir. Mas o que é certo, é que já vivi algo de próximo depois. Várias vezes. Ao acordar, o que torna a coisa ainda mais poética, porque se acordar é o mais próximo que podemos ter de ressuscitar numa vida normal, ressuscitar para sentir a morte logo a seguir é incrivelmente frustrante. Embora não seja frequente, acontece-me dormir com os braços debaixo do meu peito, virado de barriga para baixo. Quando isto me dá, durante o sono, tenho um despertar incrivelmente assustado: abro os olhos, o ar não entra nem sai, não me consigo mexer, não consigo falar. Sou um cadáver, com a diferença de que os cadáveres normais não sentem metade da aflição que esses pequenos segundos me provocam. Depois, com alguns truques que fui aprendendo, vou desentorpecendo, e alguém parece girar a chave de ignição para que o meu corpo funcione mais uma vez.

Penso nesta pequena experiência quando não me sinto bem com a minha vida e me sinto triste. Porque se eu tenho a capacidade para "vencer" essa morte, de saltar sobre ela e ter a oportunidade de experimentar a vida, porque me hei-de sentir tão triste e cabisbaixo naquelas ondas que são como as monções, que me assolam o interior e me inundam numa coisa triste que eu nunca sei o que é, só sei que não é tristeza? Não sei, mas também me faz morrer um pouco.
No entanto, da próxima vez que "vencer" a morte, sei que vou ressuscitando esse pouco que morreu. Porque a minha alegria é feita de esperanças parvas.
E nesta frase, em vez de complexo, sou um humano normal.

segunda-feira, novembro 26, 2007

Actualizadela

Os últimos tempos não têm sido fartos em posts. Como também não o têm sido em novidades, penso que o parágrafo das justificações pode encerrar aqui.
Ora bem... Dia 22 de Novembro, fez anos Scarlett Johansson. Um dia antes de um camarada de outras aventuras, el señor Juan Pedro. Como ele é, quase certamente, o grande criador teórico da ciência dos pretextos, aproveito-me dos seus ensinamentos e uso estas breves demonstrações para justificar isto

Pronto. Já está
Cinema: mantendo uma regularidade que já não conhecia há muito, muito tempo, voltei a ir ao cinema na semana passada. Saí delá extremamente satisfeito e convencido de ter visto aquela que é, provavelmenbte, a coisa mais tresloucada cinematograficamente falando deste ano. A única concorrente de "Planet terror", de Robert Rodriguez, neste cobiçado prémio é "Shoot'em up", um delirante filme de acção de imagem real com o espírito dos cartoons da Warner, em dose ultra-violenta.

A história, voltando ao catedrático J.P, é um mero pretexto: um desconhecido assiste uma mulher a dar à luz, enquanto despacha uns quantos tipos ao tiro. Esse bébé parece ser importante e é perseguido por um tenaz e desequilibrado capanga, que tudo faz para aniquilar o herói e a criança. O herói pede ajuda a uma prostituta com um problema hormonal que lhe permite deitar leite pelas mamas quando quer e a perseguição continua.
Estes frágeis pedaços de argumento são colados pelo que é, afinal a base e única razão de ser do filme: as cenas de acção tão over the top que são, em simultâneo, homenagem e paródia a um género que, salvo raras excepções, já é de si memso auto-paródico: o cinema de acção. Temos coreografias e situações de um absurdo estapafúrdio tal que provavelmente nunca foram tentadas no cinema pelo pouco bom senso que ainda costuma imperar no género. Neste filme, o filtro foi tirado e o bom senso fugiu para nunca mais ser encontrado. Para além do referido tiroteio enquanto uma mulher está a dar à luz, temos outro no meio de uma cena de sexo (que, temos herói, vai decorrendo no meio da troca de tiros); outra em descida de pára-quedas; outra depois de terem partido os dedos ao herói; e por aí fora...
E esqueçam lá Denzel vs Crowe: o duelo interpretativo do ano está aqui, com um Clive Owen cada vez mais a exigir um combate pelo papel de James Bond (e tendo em conta que Craig já é quase perfeito, que grande concurso seria esse!), com uma mistura de fleuma e sarcasmo nos one-liners e com incríveis tiradas que começam sempre com "Do you know what I hate?" e que acabam sempre em acções inverosímeis, como atirar um condutor fora da estrada num ciade apenas porque este não usa o pisca-pisca quando ultrapassa, ou dar palmadas no rabo de uma mãe que ameaça bater no filho num museu; e Paul Giamatti, mastigando as suas linhas de diálogo como só um verdadeiro actor de comédia ácida sabe (vejam "American Splendor", onde Giamatti interpreta Harvey Pekar, o cartoonista norte-americano, e vejam se não é verdade) e combinando num só papel o impiedoso assassino e o homem de família que tem de chegar a tempo à festa de anos do filho. Owen e Giamatti entram no espírito anárquico da fita e a coisa ganha contornos de um confronto entre Bugs Bunny, pois o Mr. Smith de Owen passa o tempo a comer cenouras (que no intermédio são usadas como armas também), e Elmer Fudd. A certa altura, Owen vira-se para Giamatti e pergunta: "What's up, doc?" É uma piscadela de olho tão óbvia que é impossível não nos deixarmos contagiar.
Em suma, há já algum tempo que não me divertia assim a ver um filme. Fez-me lembrar "Kiss kiss, bang bang", embora, claro, sem o refinamento do argumento brilhante de Shane Black, um dos cardeais do tipo de filme de acção que aqui é parodiado. Michael Davis, realizador e argumentista, é extremamente competente, principalmente no argumento (que são praticamente one-liners uns atrás dos outros), mas na realização, dei por mim a pensar no que seriam estas espectaculares coreografias através do olhar de um John Woo ou um John McTiernan, realizadores do género, mas sempre dispostos à paródia, principalmente McTiernan, que já o experimentou nessa obra-prima que é "The last action hero", onde consegue misturar Schwarzeenneger, Ingmar Bergman e Shakespeare. Não acreditam? Vejam.
E no entratanto, dêem um salto ao cinema e vejam este filme. O Mr. Smith de Clive Owen ia detestar que não o vissem. E vocês não querem definitivamente saber o que acontece quando Mr. Smith detesta alguma coisa.

P.S Monica Bellucci entra. E como em Scarlett Johansson, penso que as palavras são escusadas.

quinta-feira, novembro 22, 2007

Pontos de vista

Neste anúncios, algumas raparigas verão uma mulher bonita a ser explorada pela gigantesca máquina comercial da indústria de lingerie; alguns homens elogiarão uma fêmea a que não medo de explorar e brincar com a sua sexualidade; eu vejo a Heidi Klum, a fazer piadas com as mamas e a brincar com elas para gáudio de alguns. Nos quais me incluo.

quarta-feira, novembro 21, 2007

O politicamente doente


Os Estados Unidos são um país com duas camadas, no que à cultura diz respeito: por um lado, têm algnuns dos artistas mais brilhantes do showbiz a criarem coisas magníficas, que fazem parte da nossa mochila cultural interior e se inserem no nosso DNA de referência automàticas; por outro, criaram grupos de escrutínio dos media, que re-aarranjam essas mesmas oras brilhantes de modo a que correspondam a padrões de politicamente correcto e de aceutável pelas normas vigentes daquilo que não se deve incomodar. Com a proliferação de lobbys de defesa de determiandos grupos étnicos, religiosos, ideológicos e sexuais, os artistas ficam sempre a perder: cenas de sexo, memso importantes para o desenrolar de uma história? Esqueçam; o uso de palavrões que pode definir o carácter de um personagem? Usem outra coisa!; alguém pegar em duas pistolas e massacrar 20 gajos? Já pode ser.
No entanto, nada me preparou para a última vítima de revisionismo histórico. O caso de "E.T", em que Steven Spielberg apagou pistolas de agentes do FBI para as substituir por lanternas foi largamente discutido. "ET" é um dos marcos da infância de muita gente, onde me incluo, e um filme marcante para aquele que não eram crianças quando o viram. Mas o que é "ET" comparado com "Rua Sésamo"? Este é O programa infatil por excelência. Conhecemos a música, os personagens, aquele mundo foi em determinada altura o nosso, onde podíams ir a casa da Avó Chica comer um doce, comprar um saco de mação na mercearia do senhor Almiro, ouvir o Zé Maria ler-nos uma história na sua livraria, perguntar ao André o que poderia ele fazer relativamente àquela nossa estante que estava estragada ou simplesmente sentarmo-nos num banco à espera que a Guiomar passasse.
Os produtores da versão origal norte-americana, idealizada pelo grande Jim Henson, estão prestes a dar uma machadada nas memórias das crianças do lado de lá do Atlântico, com a intenção de atenuar alguns pormenores da versão original que podem ferir susceptibilidades hoje. Primeiramente, sou contra estas coisas, mesmo que as razões possam ser muito boas: os objectos culturais são o espelho do seu tempo. Nunca me ouviram pedir que se queimem ou guardem para que ninguém possa ver os documentários de Leni Riefenstahl acerca das comemorações nazis. No entanto, os responsáveis pela Rua Sésamo desencantam motivos que não lembram ao careca. Recordam-se do Monstro das Bolachas? Sim, destrambelhado, guloso e fofinho. Pois na edição em DVD das primeiras seasons, a ser lançada este mês, boa parte dos sketches em que ele come bolachas e doces afins vão desaparecer, pois são considerados uma apologia às diabtes.
O Ferrão, aquela criatura mal-disposta, rezingona, sarcástica e misógina? Leva outro corte porque, segundo os produtores, é um personagem em depressão e as crianças não toleram personagens deprimidos. E o mesmo se aplica ao Becas, que raramente é visto bem disposto e tem um ar perpetuamente carrancudo. Já o Egas via levar um jeitinho porque parece um atrasado mental. Estes dois, aliás, eram uma relação gay nunca assumida, na visão dos produtores. E há mais: cenas campestres não podem incluir agricultores a carregar baldes de comida sem luvas e as vacas devem comer relva, não ração com hormonas; um skecth onde dois perosnagens encetam uma luta de almofadas é cortado porque há o risco sério de poder levar a lesões na cabeça, caso seja tentaod em casa; e o Poupas, o simpático e amigo Poupas, verá as cenas em que ele vê uma criatura imaginária que mais ninguém vê retocadas, porque dão dele a imagem de um maluco.
Caramba... Só nestas linhas, percorri uma parte da minha infância e começo a pensar se algumas das razões pelas quais não bato bem da cabeça se prendem com essa série papão e molestadora de criancinhas que é "Rua Sésamo"...
Quem, como eu, acha este politicamente correcto perfeitamente estúpido, grite "Peixe, peixe, peixe!".

sábado, novembro 17, 2007

"American gangster"



Este filme tinha tudo para ser o melhor do ano a seguir a "Zodiac": Denzel Washington e Russel Crowe protagonizam; Ridley Scott realiza; Steven Zaillian escreve; uma equipa técnica absolutamente intocável; uma história verídica de criminalidade com o pano de fundo da Nova Iorque da década de 70, fazendo lembrar "The french connection". O que podia falhar?
Ainda não sei bem o quê, mas alguma coisa falhou. Quero que percebam: o filme é bom. Mas não devia ser só bom, tinha potencial para ir bem para lá disso. O filme retrata, para quem não sabe, a história da ascensão e queda de Frank Lucas, o primeiro grande gangster negro dos Estados Unidos, que conseguiu o que ninguém antes conseguira: trazer droga directamente da Ásia e assim antecipar-se à Máfia, controlando o mercado de dorga de Nova Iorque. Lucas tem no seu encalço Richie Roberts, um dos únicos polícias honestos e incorruptíveis de Nova Iorque. Está aqui o material de que se fazem fitas míticas.
E nalgumas coisas, temos o que nos é pedido: Denzel Washington nunca consegue ser não-carismático, mesmo que lhe pedissem, e encarna Frank Lucas como um ícone, uma figura maior do que a vida, com toda a gravitas natural que uma interpretação denzeliana pode trazer. O filme foca muito a temática familiar e é perceptível porque é que todos seguem Lucas, mesmo quando as suas acções são reprováveis. A mulher, a mãe, os irmãos... O que ele faz, deve estar certo. Nós acreditamos em Denzel, e por arrasto cremos nisso. No entanto, e esse é um dos pequenos segredos omitidos nas críticas que li, Russel Crowe, num exercício de contenção minimal, que na sua carreira apenas encontra paralelismo em "O informador" é o centro estóico da história, o fio condutor que nos faz seguido, encarnando um polícia que louvável em todos os seus valores profissionais, na sua irredutibilidade como polícia e homem, mas que é incapaz de combater as suas próprias falhas: a falta de dedicação à família e o adultério que nele é tão natural como respirar. Ao opôr um homem imoral nos actos, mas recto nos valores, e outros que é o seu opoosto, principalmente quando o primeiro é gangster e o segundo polícia, Ridley Scott podia ter conseguido aqui uma fita verdadeiramente poderos, num duelo moral para o qual estava servido de espectaculares actores.
No entanto, este é um filme também de Brian Grazer, o produtor, e por isso a intriga cirminal nunca pode ser perdida de vista. O argumento envolve um grupo de polícias altamente corruptos, a relação de Lucas com um Don mafioso e as relações entre o crime e as foguras públicas do entretenimento. É aqui que o filme começa a ter demasiadas cordas para dedilhar e algumas delas acabam por ser só meio dedilhadas, fazendo o filme perder força. Os dilemas morais dos dois personagens principais estão lá, mas, à excepção da amizade de Roberts com o seu melhor amigo, que por acaso é sobrinho de um mafioso, nunca são convenientemente explorados e fica-nos mais uma narrativa escorreita, interessante de seguir, mas que não ressoa devidamente os grandes temas que o filme se propunha explorar. Nisso, é um filme falhado.
Tecnicamente, Scott passa o tempo a fazer uma compilação dos nossos filmes de gangsters preferidos: "Scarface", Goodfellas", "O padrinho" e por aí fora, adicionando-lhes a experimentação técnica que lhe é costumeira, embora nunca chegue aos calcanhares da demência do irmão Tony, que faz de cada filme sue uma experiência indicada para quem tem epilepsia e quer ter vários ataques seguidos. A fotografia de Harris Savides é soberba (superior talvez ao sue trabalho em "Zodiac", e isto é dizer muito) e o sempre excelente Pietro Scalia orienta-se nas convulsões técnicas de Scott, que, apesar de tudo, não deixa a sua marca neste género cinematográfico. Sendo parcial, dei por mim, a certas alturas, a suspirar por um cameo de Scorsese na realização.
"American gangster" podia ser um Don, mas acaba por ser apenas um capo, que tem agum poder, mas nunca se superioriza relativamente aos padrinhos.

"The golden age"



Mais do que a sequela de "Elizabeth", é a continuação normal da história. Confesso que não vi o primeiro, por isso não sofro do síndroma de comparação que alguns conhecidos exibem quando falam desta segunda visita ao reinado de Isabel I. Desta vez, o ponto fulcral é o confronto entre aquele que, no período em que decorre o filme (final do século XVI) , era o maior império do mundo, a Espanha, e o reino de Inglaterra, liderado por uma soberana que tem os seus próprios problemas internos, sob o pano de fundo geral europeu da guerra entre Católicos e Protestantes: a prima, Maria Stuart, presa sob suas oprdens na Escócia, e um barril de pólvora à espera de lhe rebentar na cara. Pelo meio, há ainda o problema de arranjar um marido à monarca e um breve flirt com Walter Raleigh.
"The golden age" é, antes de mais, um "Cate Blanchett show", em redor de uma actriz que por vezes parece enorme demais mesmo para um ecrã de cinema, tal a forma como a sua força quer rasgar a tela e não pode. Para mim, ela foi o melhor do fuilme e arrasou-me por completo, mesmo estando à espera disso e sabendo que Cate é só um das melhores actrizes de cinema da actualidade. Por detrás dela, há um elenco de excelentes valores (Geoffrey Rush, Clive Owen, Abbie Cornish, Samantha Morton), mas os seus personagens ficam esquecidos em detrimento da rainha. Cada um tem o seu pequeno drama pessoal, mas tudo a traço esparso sem grande demora. A meu ver, o filme peca por isso: esquecendo-se dos personagens fundamentais da época isabelina (Francis Walsingham, Walter Raleigh e mesmo Francis Drake aparece como que num inspirar e expirar), o filme perde força e presta um mau serviço à grande história que quer contar e que culmina num dos maiores feitos militares da História: a derrota da "Armada Invencível" espanhola que se aprestava a invadir Inglaterra. Shekhar Khapur eleva o nível do cenário, do vesturário e do visual e até tenta ensaiar uma pequena mistura entre Jesus de Nazaré, Joana d'Arc e D. Sebastião quando Elizabeth surge aos seus soldados perto do final num cavalo branco e enceta um discurso que parece uma imitação da pré-batalha de Agincourt do "Henrique V" de Shakespeare, mas ao perder de vista a profundidade dos secundários, perde algo do espectador. Perdeu-me a mim, pelo menos.
E claro, há erros históricos, mas isso há em todos os filmes. No entanto, seria necessário transformar um dos maiores monarcas da História Europeia, Filipe II de Espanha, num tolo maluco, com andar de corcunda, como marioneta de padres e que, com voz maviosa, ordena o esmagamento de Inglaterra como se fosse Blofeld? Acho que não!

"Rescue dawn"



O novo de Werner Herzog proporcionou-me a rara experiência de ver um filme europeu no cinema, apesar de ser falado em inglês. Christian Bale interpreta o personagem principal, Dieter Dengler, um piloto norte-americano de origem germânica que se despenhou no início da guerra do Vietname em território asiático, sendo preso. Mas essa é só a primeira parte da história; a segunda é uma fuga destemida de um campo de prisioneiros no meio da selva, que Dieter partilha com Duane, um homem que já se encontrava no campo quando Dengler chegou, interpretado por Steve Zahn.
Herzog não desiste desta história, que já tinha até abordado num documentário intitulado "Little Dieter needs to fly". É fácil de ver qual a obsessão do realizador com Dengler: os pormenores da sua narrativa abordam dois dos temas que percorrem a sua obra, a imponência, dureza e majestade do factor natural e o correspondente esforço e engenho incríveis de homens que se propõem a enfrentá-lo. Boa parte da filmografia de Herzog parte dessa dinâmica conflituosa ("Aguirre", "Fitzcarraldo", e o recente documentário "Grizzly man" são os melhores exemplos) e os filmes pelo qual o recordamos. Herzog sabe como poucos filmar o estado natural dos elementos e tem uma enorme paleta com que trabalhar nos arrozais e florestas densas do Vietname. O filme é poderoso num ecrã de cinema, porque ficamos obviamente reduzidos à nossa condição perante a Natureza de Herzog.
Mas "Rescue dawn" deve parte do impacto que tem à intrepretação de Chirstian Bale, física como quase todas, naquilo que já se vai tornando imagem de marca no actor. Como interpretava alguém exposto a um duro cativeiro, perdeu perto de 40 quilos, o que é de valor, ficando ainda assim longe da holocáustica figura que exibe em "O maquinista". No entanto, Bale não se limita a isso: longe de envergar clichés de prisioneiros (como faz Jeremy Davies no filme, o eterno cobardolas em cenários de guerra), Bale é como um puto que aterrou num território novo, tendo o azar de ter uns vizinhos que por acaso o torturam ocasionalmente. A sua amizade subtil com Duane, numa outra interpretação a destacar de Steve Zahn, mantém o fime seguro e o calor humano no espectador.
Tem, talvez, um final demasiado up-lifting, algo atípico em Herzog, mas é ainda assim uma obra de grande interesse.

sexta-feira, novembro 16, 2007

O que a vista alcança

Como em tudo na minha vida, não há fome que não dê em fartura. Depois de alguns meses sem ir ao cinema, eis que em três semanas, igual número de filmes se submeteram ao escrutínio atento e apurado da minha urgência de olhar. Por outras palavras, não tinha que fazer e fui ao cinema.
Pela primeira vez em algum tempo, vi uma série de fitas seguidas em que nenhuma das quais se encaixava no meu grau mais alto de salivação. De diferentes maneiras, eram fitas que me apeteciam ver, mas apenas e só porque seriam interessantes, nada mais. Não que tenha perdido essa centelha que inflama de cada vez que me põem a falar de filmes (por esta altura da vida, com outras centelhas apagadas em mim, se a do cinema se apaga, é como se me transformasse num zombie de George Romero), mas fui ver um filme com a pura intenção de me pôr na pele do espectador comum, aquele que vai aocinema apenas e só como entretém, e não desespera pela estreia de certe e determinada obra. Foi engraçado. Dápara perceber porque é que há pessoas diferentes de mim, que não se entusiasmam com coisas algo supérfluas: têm contas para pagar ao fim do mês, namorado/a e objectivos na vida. Mas nós cinéfilos, geeks, cá andamos, porque sem nós, haveria muito boa gente desempregada, e uns outros quantos sem conhecer o poder de determinados filmes, a capacidade de realizadores que os media não se querem dar ao trabalho de apresentar ao público. Como já tenho levado alguns desses filmes (e nalguns casos, séries) a pessoas que conheço, de alguma forma sinto-me útil. Uma utilidade (f)útil.m Mas ainda asism utilidade.

segunda-feira, novembro 12, 2007

Dívida paga


Norman Mailer morreu este fim de semana, um dos eternos membros da antecâmara do Nobel, o grupo de escritores que todos os anos vão ganhar o prémio, mas que nunca conseguem. Lobo Antunes também por lá costuma parar, uma vez por ano. Mas enquanto o português ainda pode esperar qualquer coisa, Mailer já não, por motivos que a generalidade da crítica considera imbatíveis.
Relembro Norman Mailer por razões estranhas. Embora o ache um excelente escritor, não sou um especialista ou fã acérrimo. Só li dois livros da sua lavra, "Os nus e os mortos" e "A canção do carrasco". É uma personalidade fascinante, em toda a sua misoginia, provocaçao gratuita e desafio constante das normas vigentes, para além do seu comportamento em sociedade ser pouco menos que excessivo. Fundou o "Village Voice", megafone da inteliggentsia norte-americana, e pelo caminho, tornou-se um dos clichés das décadas de 60 e 70: o judeu revoltado. Mailer, no entanto, é tudo menos um cliché: bruto como as casas, intenso, enfant terrible e genial. Talvez tenha sido por tudo isto que nunca ganhou o Nobel, e que Saramago ganhou: não discutindo os seus méritos ou deméritos artísticos, o Saramago personalidade é chato e nem o facto de estar ligado a um partido de oposição clandestino numa ditadura lhe dá uma aura carismática ou especial. É um tipo que foi viver para Espanha e de vez em quando, diz barbaridades. Figo também era assim.
Então porque estou a lembrar Mailer? Porque lho devo. Há anos que estou para acabar de ler uma obra do escritor e sinto-me mal com isso. Não falo de dois ou três anos: é um espaço intemporal vergonhosamente mais extenso, tão vergonhoso que não o vou revelar aqui. Em minha defesa, posso dizer que a obra, "O fantasma de Harlot", é um monstro com a modéstia de 1361 páginas, o que, tendo em conta que tenho mais livros para ler e costumo abocanhar vários ao mesmo tempo, é de respeito. Mailer tem uma escrita cativante, mas outros escritores também, e esses escritores são mais comedidos na extensão do que têm para contar. Logo, ando a pousar e levantar este livro num movimento perpétuo de leitor que embora não desistente, tem um déficit de atenção extremo.
Mas fica aqui prometido, em público, que o relato de Mailer da história da CIA não será esquecido na minha agenda cultural. Antes que o fatntasma de Mailer me enfie "O fantasma de Harlot" pelo olhos. O homem que esfaqueou a segunda mulher numa festa da sociedade era homenzinho para isso.

sexta-feira, novembro 09, 2007

O tempo


Fiz há poucos minutos 25 anos.
Nada mudou, penso.
Esperem, acho que a Monica Bellucci está a entrar...
Não, é o vento.
Os 25 estão iguais aos 24.

quinta-feira, novembro 08, 2007

O reencontro de dois monstros


Al Pacino e Robert de Niro em "The righteous kill"

terça-feira, novembro 06, 2007

Modas


O Moleskine é o caderno da moda. Capa preta dura, fitinha de elástico negra para melhor prender as páginas, compartimento para guardar as folhas soltas: enfim, o próprio Macgyver certamente usava um. Nós é que nunca o vimos.
Com os Moleskine vem um papelino a contar a enda do caderno, que não envolve dragões, nem sequer Leonardo da Vinci, mas ainda assim lá adiantam que Vincent van Gogh e Ernest Hemingway usaram esse mítico canhenho. Van Gogh deu um tiro no próprio peito; Erneste Hemignway abocanhou uma caçadeira e disparou. Ou seja, ambos se suicidaram. Isto deverá animar os utilizadores.
Por enquanto, não penso em Moleskines. Não é que eu seja anti-moda: sou mais um fora de moda. Na verdade, acho que a minha criatividade já não funciona sem os míticos cadernos de capa preta de cartão do Continente. Custam menos de 1 euro e também se pode lá escrever. Penso que Belmiro de Azevedo já os terá utilizado; e estamos a falar de um tipo que está na lista da Forbes dos 500 mais ricos do mundo.. Não escreveu o "Adeus às armas", mas também não está mal.

O cansaço das palavras

Enquanto insultava Paulo Coelho (sim, podem-me acusar de falta de imaginação) e percorria alguns blogs, perguntei-me quando é que as palavras começam a ser banais. Quando é que as expressões que usamos para transmitir aquilo que é sempre intransmissível perdem o poder e passar a ser letras escritas ou sons falados. Onde estará o momento em que poder poder mágico de um vocábulo é desvendado e assim apagado? É uma pergunta pertinente, porque provavelmente depende de nós. Acho que as palavras são, de tudo o que temos, aquilo que mais directamente depende de nós. Passam de uns para os outros. Na minha boca, esta é fraca; mas na tua é forte, naquela relação que tens com o outro.
Fascinam-me as palavras. Aborrece-me quando começamos a usar as mesmas palavras em situaçõe semelhantes, como se as pessoas fossem iguais para nós. Como se todas no fizessem sentir a mesma coisa. Devíamos ter palavras diferentes, frases diferentes, para que cada pessoa se pudesse sentir especial, mesmo quando o mundo parece ser tudo menos isso.
Já alguma vez uma palavra vos conseguiu fazer passar de um monte de esterco a um prato de arroz doce quente? A mim já. Algumas vezes. Mesmo que a pessoa do outro lado não soubesse que palavras abriam a minha fechadura.
Serão as palavras também intimidade? E que intimidade têm outras elas?
As palavras sabem o nosso limite quando as usamos. Por isso anunciam o génio de quem as sabe usar, mas também denunciam os impostores que querem ser mais do que são através delas.
Por isso gosto das palavras. De um modo secreto, elas são quem as escreve. Mesmo que se tenha de ler nas entrelinhas. Porque aí também existem palavras.
Nós é que não as vemos à primeira.
E não esquecer que as pessoas também têm entrelinhas. Mas estas já são mais complicadas de se ler.
Chegado este ponto, estas palavras estão cansadas. Ou apenas aborrecidas. Imploram-me que páre. Ponto final.

segunda-feira, novembro 05, 2007

Greve

Para quem ainda não sabe, o Sindicato de Argumentistas norte-americano colocou todo o mundo do entertenimento audiovisual em cheque, entrando em greve. Após uma primeira fase onde avisaram das suas intenções e tentaram chegar a um acordo com a Associação de Produtores, com as reinvidicações de maior controlo criativo sobre os seus guiões e um aumento das percentagens no que toca às receitas de venda de DVD. Os produtores, no entanto, não atenderam às exigências, pensando que a greve era um bluff; mas não é; e a greve começou hoje: nninguém que ecsreva para televisão ou cinema vai, até novas ordens, escrever ou teclar o que quer que seja para qualquer produção cinematográfica ou série, o que já está a levar à paragem de vários projectos, e também a afectar a sequência de episódios de programas que estão no ar e outros que ainda não estrearam.
Acho que de súbito, e à força, alguém se lembrou da importância do argumentista. O que está em questão parece-me justo: aquela que, na minha opinião, é a posição mais importante na criação de um filme ou uma série está a ser mal paga, se tivermos em conta no quanto, por exemplo, as séries actuais devem a brilhantes argumentos. O director da Associação de Pordutores veio dizer que acha até que quem escreve é muioto bem pago: 200.000 dólares por ano. Parece muito. Quando confrontado com quanto, em média, um produtor ganha no mesmo espaço de tempo, dispara: "20 milhões... e se for despedido, até pode ganhar mais." Como alguém que quer seguir esta ocupação, estou plenamente solidário com os homens da caneta. Os cabecilhas dos estúdios sabem que o dinheiro não se ganha sem a massa criativa, portanto, inevitavelmente, terão de ceder alguma coisa para que as coisas voltem à normalidade.
Como espectador, no entanto, acho que estes escritores são uns filhos da mãe. Tudo isto vem atrasar belas coisinhas que vão estrear no ano que vem. Se bem que a 5ª e última temporada de "The wire" já está completamente gravada, o memso nao se plica à 4ª de "Lost". POrtanto, vejam lá isso, porque não se brinca com estas coisas, ok? Querem chatear os produtores, tudo bem, esses gajos são uns chupistas. Agora, eu não tenho culpa e já esperei 7 meses por novidades da ilha. A ver vamos se temos de nos chatear...

sexta-feira, novembro 02, 2007

Já alguém ouviu...

...Rui Nova, o Mika português?

quinta-feira, novembro 01, 2007

"Pushing daisies"


Apesar de ver muitas séries e de gostar de um número razoável delas, não é muito fácil ser conquistado de chofre por uma. É como quando me apaixono por uma rapariga: há um período em que vou ficando embruxado, não me lembro de alguma vez ter visto uma miúda e imediatamente me ter apaixonado por ela. Por isso não acredito em amor à primeira vista. Já com séries, lembro-me que aconteceu apenas 3 vezes: "Lost", "Millennium" e, óbvio em alguém que é vidrado em fenómenos paranormais, "The X-Files.
Aconteceu novamente esta semana. Não a coisa das miúdas, mas uma série: "Pushing daisies", um OVNI (ainda a remeter para "The X-Files") no meio televisivo actual, o que tendo em conta o eclectismo actual, que vai desde a mais normal "Greys anatomy" à bizarria de "Lost", do esquematismo de "House" ao ulta-realismo de "The Wire", é dizer bastante. O ponto de partida não é novidade: Ned é um miúdo descobre que tem o poder de, com um toque, ressuscitar o que está morto; no entanto, se os ressuscitados alguma vez lhe voltarem a tocar, morrem instantaneamente. Já adulto, e dono de uma loja de tartes, ele usa este poder, algo a contra-gosto, para ajudar um detective privado a resolver homicídios falando com as testemunhas mais fiáveis: as próprias vítimas, que um minuto depois de Ned lhes tocar, voltam á sua condição. Esse minuto é importante, porque se Ned não os devolver À sua condição defunta, alguém nas proximidades morre.
Entretanto, uma das vítimas é o amor de infância de Ned, Chuck (é mulher), e Ned não resiste: ao invés de a reverter à sua situação, mantém-na viva, meesmo sabendo que nunca mais se poderão tocar. Tendo em conta que bastam cinco segundos para o espectador se aperceber que entre Ned e Chuck existe voltagem suficiente para iluminar todo o Parque das Nações durante meses, temos aqui um engraçado imbróglio romântico. A série podia ficar-se por aqui, que um romântico sensível como eu já a seguiria até ao final. Mas não: todo o tom é uma fusão entre "O fabuloso destino de Amélie" e o design da fábrica de Willie Wonka de "Charlie e a fábrica de chocolate". Numa época em que se louvam os grandes dramas pela carga profunda de análise psico-analítica que trazem, sabe bem ver uma série pelo simples prazer de vermos contar uma história que apela ao lado mais soft que há em nós. E todos temos um...
Que isto venha de um dos argumentistas de uma série mediana como é "Heroes", surpreende. Um dos produtores executivos é Barry Sonenfeld e a série é um mimo visual e o contraponto ideal para as agruras do nosso dia-a-dia. Apenas uma preocupação: duvido que os próximos episódios mantenham o altíssimo nível do primeiro. Mas estarei cá para confirmá-lo. Gulosamente.

Um bar alternativo


Há um bar em Lisboa que deve ser a coisa mais alternativa que por lá anda. Não sei onde é, mas hei-de lá ir. Ouvi dizer que passam Fred Ferdinand, Arcaid Fire e Nick Wave...