terça-feira, janeiro 12, 2016

Truques



Aconteceu uma noite que assim, parado no caminho, assentei mesmo a meio da migração de pirilampos. Passaram por mim, rodearam-me e no calor de Verão, estival e seco, que preenchia pontilhado os espaços onde não conseguia encontrar-me, nem no destino nem na presença, a luz era fugaz, corrida. Nem me lembro agora porque parara, pois não fora cansaço, nem urgência, nem esquecimento, nem sequer nenhum interruptor que impedira o meu corpo, frágil e entroncado, de exercer acção. Se me tentar recordar, só me ocorre o vento, soprando as searas dos campos, os mesmos de onde os pirilampos, em consonância, decidiram que era a hora. Desconheço as minutas dos minutos, mas sei que era a hora. Pequenos luzeiros, vagantes sinais no peito da noite, oferecendo-se às minhas dores, aos meus vagares vagalumes.

Parei por ti, acho. Quanto mais me recordo, mais sinto que era tudo sobre ti, sobre mim, sobre quem era antes de te conhecer, quem deixei de ser depois de, devagar, deixares tudo o resto vago, vagamente.

Sem me mexer muito, sentei-me na estrada de terra. Grãos de poeira tomaram morada na minha roupa e os pirilampos, sem avançar, haviam descoberto nas partículas e moléculas que formavam o meu casulo invisível. uma razão mais para aprender ballet, instintivo. Devia ter sorrido, mas não o fiz. nem me zangue~i, nem me aborreci. Apenas estive, e em meu redor, com o vento, as luzes, o lençol desfraldado dos campos, até mesmo a temperatura, tudo variava e flutuava, mexia, vivia. Eu estava parado, estático. Um travão na minha vontade, e tanto brilho em meu redor, acredito até que pousaria em mim se ao menos conseguisse parar o meu próprio trovão e simplesmente respirasse, sem sobressalto, apresentando um sinal de era porto seguro. Mas não, o exacto oposto.

Os pirilampos contornaram-me durante algum tempo e num golpe de súbito, apagaram-se. Reagi, como não? De olhos abertos, vi-te então, uma imagem pálida, um simples susto da noite, e beijámo-nos e então sumiste, e veio outra além de ti, que eu desconhecia, e ela sorriu e contou-me uma piada, que esqueci, mas era mesmo engraçada e tinha nas mãos coisas que nunca tinha visto, mas eram um quarto daqueles onde dormimos sem sobressalto. Não sei quem era, mas nos dedos trazia várias respostas, pois quando se sentou, os pirilampos, ponto por ponto, trouxeram o céu à Terra, encostadinho a mim, bem próximo de tudo o que está preso ao que se move sem se mexer.

Ficámos ali, sem nada mais que não o maior jantar à luz das velas sem comida que podia ser concebido. Se era ilusão, não me importava: quando lhe chamam magia, ninguém se chateia.