sábado, maio 08, 2010

Uma verdadeira tragédia


Na semana passada, estreei-me em plenas funções na capacidade de actor trágico. Tivera, há uns bons anos, uma ligeira aventura por tais territórios, mas muito basicamente, limitava-me a ser humilhado em palco, e morto fora dele. Tendo tudo em conta, acabava por não ser um grande esforço de fingimento de actor, pelo que me acontecia nessa altura.
No entanto, este ano, meti na cabeça que queria fazer algo de diferente. Eu sou espectacular quando essa ideia me começa a escarafunchar o cérebro. Da última vez que isso aconteceu, acabei com uma putativa tese no colo, que nunca mais consigo despachar. Tenho a capacidade de planeamento de uma harpa e isso acaba sempre por me sair caro. No caso de que falo neste post, saiu-me do corpo e do próprio orgulho. Um papel dramático envolve, claro está, drama; e este, o de um rei que (SPOILER ALERT)encontra a mulher morta quando chega a casa, expulsa o filho e depois, acaba por matá-lo e ter de lamentá-lo, ( FIM DE SPOIELR) obriga-me a exercitar certos músculos do meu coração que estão povoados de mini-aneurismas vários: tristeza, luto, dor, evitar cantar a mim próprio "Bitches ain't shit". Eu não sou muito bom a exprimir tristeza de qualquer tipo. Sou mais sorumbático e chateado, não tanto "ai ai ai, choro e ranger de dentes". O que este papel me obriga a fazer, de actuação para actuação, é ser um fingidor. Sei que não sinto completamente aquilo, por isso faço figura de urso, umas caras de tristeza, embasbacamento e raiva, e tento que a plateia à minha frente acredite naquilo. Ou pelo menos, não pense "Meu, aquele Diogo Morgado é mesmo bom actor comparado com este gajo!".
A noite de estreia foi um exercício de fingimento perfeito. À minha volta, gente tremendamente nervosa, a perguntar-me se também estava.; eu, o centro estóico em mundos a tremelicar, dizia que não, que nunca ficava nervoso, e parecia o Mourinho no centro do relvivado em Milão, a olhar o medo nos olhos. No entanto, por dentro, depenava-me todo. Quando me junto com a tristeza, as probabilidades de espectáculo deprimente aumentam tão vertiginosamente quanto o decote da Scarlett Johansson. Havia excelentes hipóteses de aqui o menino entrar em palco, vestindo uma roupa que se assemelha ao bibe da primária de um garoto transmontano, e descarrilar uma peça que vinha a correr bem até então, pelo simples motivo de ser simplesmente mau. É o tipo de coisas que pode fazer pessoas mais impressionáveis fazer esculturas de matéria fecal nos joelhos.
A coisa, vá lá, nem me correu mal. Ao que parece, ninguém ficou a pensar que estava a apertar flatulência em palco, e isso só pode ser bom. Apesar de ter sido numa tragédia, foi engraçado sobreviver a um certo arrepio de medo que me atravessou a espinha durante algumas semanas; e ter de beijar uma rapariga em palco, ainda por cima com os meus pais a ver (pergunta de pai no jantar do dia seguinte: "Ouve lá, mas tu beijaste mesmo aquela rapariga? Está bem, está...") e de trabalhar com um grupo de pessoas que achincalho todas as semanas, mas que no fundo, até nem são más de todo.
A sério: isto não sou eu a fingir. Disfarço, mas não sou assim tão bom.

2 comentários:

Anónimo disse...

Estiveste MUITO bem, está lá calado! Parabéns!
Jinhos

Ela disse...

Quem é que tu beijas?não sabia dessa!está bem, está!...