sábado, março 31, 2012

O segredo é a alma do negócio

Ora, se um autor X publica uma obra chamada "O livro secreto dos nabos de Abrantes", isso não quer dizer que vai deixar de haver segredo, por este se tornar público? E sendo assim, qual a utilidade do material secreto se vai passar a ser usado por toda a gente? Just saying!

terça-feira, março 27, 2012

Descarga


Existe em mim um esquerdista inconformado. Em jeito de piada (ou se calhar não), um amigo meu está constantemente a dizer que sou um radical de esquerda e não admito. Talvez até estivesse destinado desde pequeno a sê-lo, até porque a conformidade com o modelo de regras social nunca foi algo que seguisse; no entanto, quis o meu destino que nascesse de um pai polícia, e de uma mãe que cedo ganhou uma posição de chefia no seu emprego. Portanto, eu sei o que são regras, o que é cumpri-las e a sua importância. Acredito em regras, porque não acho que o simples bom senso pessoal sobre para nos guiar convenientemente neste mundo.

Ora, sendo o meu pai polícia, cresci com relatos da profissão à mesa de jantar, e também rodeado de outros homens fardados que na minha visão de criança, apenas se conheciam por apelidos: o Dias, o Almeida, o Neves, o Cunha... Havia também um "Drácula", mas creio que mais por apodo do que apelido. Sempre conheci polícias. Na sua grande maioria, são tipos que não têm grande amor à profissão de polícia. São pagos todos os meses e não se preocupam ideologicamente com quase nada. Penso que a única ideologia do meu pai é o asco a Cavaco Silva, e posso dizer que me orgulho disso. Tirando isso, fazem da sua profissão é um trabalho das nove às cinco, e regresso a casa.

Achei por isso evidentemente ridículo todo o alarde que se fez em redor da carga policial da semana que passou, numas manifestações ali para os lados do Chiado. O ridículo foi o dramatismo a que chegaram as acusações, juntando tudo num saco, e levantando fantasmas fascistas de suas campas, como se de repente voltássemos 50 anos atrás. Penso que é um problema de que vamos sofrer inevitavelmente até ter morrido toda a gente que viveu sob o jugo de Salazar: Portugal ou é uma democracia plena ou uma ditadura facínora. Os intermédios e os cinzentos não interessam. E quando a vítima é um jornalista, pior ainda. De certeza que é opressão à liberdade de expressão!

Parar e pensar não é socialmente aceite na modernidade. O alarde e o barulho são muito mais cómodos e úteis para ofuscar o bom senso. A carga policial, tão conotada de vilania, respondeu, em primeiro, a um conjunto de arruaceiros que infelizmente transformam um protesto pacífico no seu recreio de grunhice. É impossível controlar esta gente, e já farta até vê-los, mas é inevitável vê-los a danificar propriedade e a perturbar o cidadão comum que protesta, e até aquele mais indiferente que está apenas a beber um café. Uma vez colocada em posição, agiu como é normal numa carga policial: formou cordão e varreu por aí fora quem não saiu do caminho. Apanhou dois jornalistas pelo caminho. Pois... Se fossem dez carpinteiros, eram mais uns; mas como eram os paladinos da verdade e da justiça (wishful thinking, desculpem), tragédia, horror e ignomínia são apenas palavras que mal descrevem o que passou. No meio do acto de ordem, alguns grunhos, com problemas mal resolvidos com a vida e consigo mesmos, decidiram descarregar frustrações diárias em gente que não lhes fez mal nenhum. Estes são, na verdade, aquele a quem se deve apontar o dedo: a cobardia e o uso indevido de autoridade são um mal em qualquer tipo de sistema político. Conotar toda uma profissão com as más atitudes de alguns elementos é um mal geral, e que toda a gente que apontou o dedo a esta carga policial, sofre e se queixa. Mais um caso de não aprender com o que se sofre. Como se o mundo fosse um constante jogo de apontar o dedo até só sobrarem culpados.

Ironicamente, todo este jogo é precisamente aquilo em que o fascismo era bom. O clima de medo e suspeita foi o que garantiu a sobrevivência do Estado Novo durante quase 50 anos. Hoje, olhar para este género de situações podendo medir todos os lados (ou seja, uma das dádivas do Estado Democrático) pode ser um passaporte para sermos chamados de simpatizantes fascistas. 38 anos depois do 25 de Abril, batemos no peito até nos saltarem cravos, mas perpetuamos exactamente os mesmos fantasmas que recusamos deixar dormir em paz. Somos engraçados, nós.

domingo, março 18, 2012

Os tribunais certos


Os anos passam, e apercebo-me finalmente o quão errado estava por me odiar a mim mesmo, ou questionar tudo o que fazia. Não interessa o que fazes agora, interessa o que já fizeste e os filtros dos outros. Contra isso, nada podes fazer. Já foste julgado, e isso é que conta. Segue em frente e aprende que no fim de contas, interessas tu e o julgamento que fazes de ti mesmo.

Vou parar é com esta merda, que pareço o Paulo Coelho.

Ser homem


O dia da Mulher é sempre uma altura de lembrar os direitos das mulheres, e o tratamento que receberam durante séculos. Fala-se de direitos de mulheres, salários e greves; de opressão e exploração. Maldosamente, certos elementos do sexo feminino aproveitam para bradar o quão superficiais os homens são. É, portanto, uma altura para grandiloquência e cabotinismo. Não é diferente de qualquer outra efeméride ou data importante, então.

Há no entanto uma vítima esquecida no meio de toda esta confusão: o homem que não sabe ser homem. Aquele que não encaixa no estereótipo que se faz dos homens, e que existe de facto. O "gajo". O macho. O indivíduo que perante um armário estragado ou um quadro eléctrico defeituoso, pega nas ferramentas e resolve o problema, enquanto lê "A Bola"; que sabe perfeitamente a diferença entre um Golf 1.3 e um Golf 1.8; alguém que sabe preencher um formulário do IRS; que malha um copo só porque os amigos estão em casa. Eu assumo publicamente que não sou este homem.

Não digo isto com o desdém de alguns. O meu pai pertence a esta categoria, e com todo o orgulho. É um senhor simples e que não tem grandes preocupações para lá do quotidiano, o que já sobra, como sabemos. Toda a vida do patriarca Cristóvão Simões girou em torno de uma ideia: suportar a família e resolver os seus problemas. Fossem eles construir uma churrasqueira, ou garantir que eu teria uma educação de luxo que me conduziria ao desemprego. Era o trabalho dele; e quando se reformou com 55 anos de uma carreira ao serviço da GNR, a sua missão estava cumprida. O filho mais velho tornou-se a primeira pessoa a formar-se na família, o mais novo tem todo o ar de ir longe na vida, conseguiu tornar-se dono da sua própria casa, tem as finanças controladas e está casado há 32 anos.. Invejo o meu pai, porque não sei se alguma vez conseguirei ser assim tão realizado nas pequenas grandes coisas que fazem a nossa vida. O que não significa que despreze aquilo em que somos diferentes, e que nunca tiraria de mim mesmo.

Sou apanhado nesta armadilha da masculinidade principalmente quando conheço outros homens, que não têm qualquer hipótese de saber as coisas pelas quais me interesso realmente. Cada homem presume que o outro fala uma linguagem comum. Por isso, se falam para nós acerca daquele escape fabuloso que meteram no jipe e lhes permite trepar seis penedos sem suar, há a expectativa de que o interlocutor perceba exactamente a maravilha dessa tecnologia. O que faço normalmente é disfarçar a ignorância espelhada no vazio do meu olhar com um "Isso é espantoso", ou "Um amigo meu falou-me disso...", dito com tamanha convicção que passou mesmo por membro daquele clube. Eu, claro, não digo muito mais. Fui-me interessando por futebol, porque seria talvez o assunto que compreenderia mais facilmente, para servir de ponte. Não é fácil falar daquilo que refiro como "aquelas coisas". Tornam-nos interessantes durante um período curto de tempo. Depois, passamos a ser como "macacos amestrados", e se tivermos sorte, ficamo-nos por aí. Se tivermos azar, evoluímos para arrogantes, o que só tem piada se tivermos realmente um ego onde caiba a arrogância. O que não é o meu caso.

Fui acusado durante tantos anos de ser um pretensioso intelectual enorme que passei a fazer um esforço hercúleo (que não foi de boa vontade, sou sincero) em perceber este género de coisas, e em dar-me com pessoas diferentes. A ironia da história é que aqueles com quem me dava anteriormente, nos círculos onde a minha pretensiosidade intelectual não só era aceitável como celebrada, me passaram a olhar de lado. Dizer que gosto de futebol é uma punhalada, e qualquer observação mais comum lança dúvidas sobre o meu estado mental. Fui confrontado por alguém que me disse, há pouco tempo, que já tinha sido mais inteligente. É provável, se calhar. Mas não trocaria a experiência a que me entreguei, acho. Não sei se fiquei a perceber mais quem não tem aspirações mais na vida que não sejam ser feliz e passar um bom bocado (e são bem nobres, tais aspirações). Pelo menos, aceitei que é um opção tão legítima quanto a minha de me destruir lentamente até não conseguir tirar felicidade de mais nada.

No entanto, penso que fugirmos daquilo que somos não será a melhor opção, mesmo que aquilo que somos não seja exactamente o que nos deixa confortável para sermos aquilo que queremos ser. No entanto, isso pode ser impossível, e no fim de contas, viver acho que é um pouco conformarmo-nos com a vida tal como a podemos esculpir. Com a matéria-prima que temos, e com as oportunidades disponíveis. Reconhecermos as limitações, e se podemos evoluir a partir daí; aceitarmos o que nos trava, e gerir as nossas expectativas com essa bagagem. Ou então, lutamos contra tudo. O que é o conselho que se dá mais vezes, mas claramente por alguém bem mais ajustado nas suas opções de vida.

Ser homem é mais do que aquele modelo que tracei, claro, embora não deixe de me sentir desconfortável a falar com a maior parte dele. O que as pessoas não percebem é que não vejo isso como o mundo a ser ridículo: encaro isso como a minha própria inabilidade em lidar com o quotidiano. Porque é a resposta mais simples, e não tem nada de errado. Com honestidade, o quotidiano pode ser muito complicado de vez em quando. Mas lá está, é por isso que tenho o meu pai.

segunda-feira, março 12, 2012

Gritos de Ipiranga 1


Aquele que a minha coluna vertebral aparenta querer mandar em relação às minhas costas.

sábado, março 10, 2012