segunda-feira, fevereiro 01, 2016

Colectâneas 3


Quando acordo, duas marcas espalham-se pela minha cama: a minha e a do sonho que tenho contigo. À noite parece que ressonas, mas é apenas o meu coração a saltar batidas que devia fazer. Chamo-lhe a apneia do suspiro.

Dou-me liberdade para te amar, sempre, sem me prender ao que seja. De te ver sempre que quero, de te beijar quando o desejo, de te ouvir rir quando bebo a tua alegria como alguém que preciso para que o mundo faça sentido. Dentro de mim, pelo menos, és livre de ser quem és, de fazeres o que desejas, de me abraçares quando te queres atirar contra o meu peito. Neste momento, para mim, liberdade é ser teu. Não é uma prisão: é espaço amplo onde consigo finalmente ser eu todo.

O teu nome percorre as minhas veias em maglev e agarra-se a todas as minhas células sanguíneas, ao ponto de sangrar ser o maior pecado que posso cometer.

Se a relva dos campos crescesse com os meus suspiros, o mundo era todo ele um pulmão de clorofila.

Vive em mim um ectoplasma bem definido, toma a tua forma quando, sem esforço, me recordo do ar em suspensão à tua passagem. As partículas assentam e fazem fila pelo rasto que deixas, desintegram-se por não terem a energia que sustenta o que deixas para trás, as sementes, a luz. O ectoplasma tenta ser tu, mas é apenas uma imagem. O ectoplasma quer ser tu. Deixas?

Quero dar-te todos os meus amanhãs, para que não acorde uma única vez na blasfémia de não te pertencer e ao teu mundinho. Para isso, gostava de embrulhá-los, com laçarote, e deixá-los à tua porta. Numa manhã fria, mas de calor tendencial, sais à rua, e antes de tudo o mais tens a caixa. A tua curiosidade desembrulha-a e o apartamento onde vives é de repente um canto, algures no mar do Tempo, e dás por ti no melhor dos mundo possíveis. Escolhes. Gostava de aparecer. Mas só se me invocares, pensando que mais do que tudo, gostavas de ouvir um "psiu". É a fórmula mágica do meu encantamento, está escrita na parte inferior da caixa. Os amanhãs são nossos, de uma maneira ou de outra, enquanto não desaprender a respirar.

Ela deixa-se levar, ele, levado da breca, deixa-se ser tótó, no cimo de uma torre. Felizmente, salvas-me, Rapunzel, e fica selado um conto de fadas onde vivem felizes para sempre, porque não interessa a duração do momento, mas a sua intensidade: aqui, está a eternidade.


Quando a cama é pormenor, tudo o mais biologia  do destino, e nos teus olhos encontro finalmente o que procurava desde que me ensinei a deprimir: o sentido de tudo, o caos organizado, a vida finalmente dar uma resposta ao porquê. É isto, és tu.


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