segunda-feira, dezembro 03, 2007

Humoristas = jornalistas?


Acho que uma das questões que tem sido mais imperceptíveis neste início do século XXI é a forma como o humor se vai transformando, lentamente, num órgão de informação mais fiável que os órgãos de informação efectivos. Parece estúpido e irresponsável dizer as coisas assim, mas quando os media se recusam a ser imparciais e independentes e estão ao serviço de alguém, temos de nos virar para algum lado.
Apesar de escrever isto após ter visto um brilhante sketch do Gato Fedorento onde Ricardo de Araújo Pereira e Zé Diogo Quintela entrevistam José Sócrates de uma forma tão descaradamente teatral como as entrevistas reais que lhe fazem, esta ideia vem crescendo em mim desde que que comecei a ver com regularidade "The daily show", que é o melhor exemplo do humor ao serviço da democracia que eu conheço. A forma como desconstrói a máquina propagandista em redor de George W. Bush, desde os seus assessores de imprensa até toda uma rede de cadeias de televisão que mostram o que acontece através do ponto de vista ideológico de quem governa é, em efectivo, a maneira mais exacta de mostrar o que realmente se passa e uma lambada na nossa cara a ver se acordamos. As notícias devem ter esse condão: mostrar a realidade e quando ela é má, faze-rnos sentir isso. Por isso o humor é tão importante nos dias que correm: mais ninguém se atreve a dar um pontapé no rabo do quarto poder. Excepto um político num cargo importante que tenha sido exposto por algum dos raros jornalistas a sério que ainda existem.
No sketch envolvendo José Sócrates, os dois humoristas atiram-lhe todas as perguntas que gostaríamos que Sócrates respondesse sem uma conversa fiada que cheira a bafio, nem um pretenso sentido de estado que quer apresentar quando recebe governantes estrangeiros. Por incrível que pareça, todas as respostas falsamente conseguidas através de uma engenhosa montagem soam reais, como se, pela primeira vez, ouvíssemos Sócrates a dizer a verdade sobre alguma coisa. Isso, pelo menos a mim, contribui dez vezes mais para compreender o lado negativo da acção deste governo PS do que ver uma hora de telejornal, onde nos podemos aperceber, a sermos perspicazes, do mesmo que o humor os impede. Mas é mais fácil chamar a atenção das pessoas com uma martelada na cabeça do que com um toque no ombro.

4 comentários:

João Saro disse...

Confessa lá que essa teoria é um bocado fraquita!

Ok, que sabendo o teu enquadramento político não é difícil de acreditar que acredites nessa tua teoria, mas se achas que os Gato Fedorento são um meio de informação mais sério que um telejornal, ok, fia-te nisso. Eu cá vou continuar a ver o Telejornal como ponto de vista informativo e os gatos como pura comédia, até porque de imparcialidade não é lá muito com eles, confessamos.

O único ponto que posso retirar positivo deste post é o facto de levantares uma questão: não é que ache que possamos falar de falta de parcialidade dos meios informativos, mas para termos um panorama completo da actualidade é necessário um esforço de cada individuo para se informar e não se ficar pelas aparências de uma notícia. Como é óbvio, o pessoal está-se marimbando para esse esforço.

E concordo, mais vale e beber umas cervejas e comer uns tremoços. Um gajo depois voto conforme a pinta do gajo e olha que acho que nós sabemos tirá-los pela pinta. lol

luminary disse...

O meu post é mais provocação que a teoria, pelo facto de o humor conseguir gozar com a forma como a realidade é filtrada pelos media, e de chamar os espectadores da sua apatia. Acredito neste poder do humor.
Para além disso, acho que cada telejornal, de cada canal, dá uma imagem diferente do país, partindo do seu conteúdo editorial ou de directivas que, bem, desconhecemos. É uma questão de ver um quarto de hora de cada um e descobrir que, afinal, temos 3 Portugais diferentes.
O exemplo do "The daily show"
é mais óbvio que o Gato Fedorento, que são mais sketch do que jornal humorístico político. E na realidade, o humor acaba por ser tão imparcial como as notícias, num país onde há jornais de direita e jrnais de esquerda. Logo, onde está o lado verdadeiro das notícias? Haverá imparcialidade? Porque embora o meu post, a bem da sátira, os coloque em pé de igualdade, é óbvio que a imparcialidade exigida a um jornalista não deve ser a mesma que a um humorista.

Enfim, mais ideias para a fogueira

Rita disse...

"não é que ache que possamos falar de falta de parcialidade dos meios informativo" - claro que os media sao parciais, seguem uma tendência mais à dta ou mais à esquerda, no caso PT qs totalmente - na actualidade - a pender para a dta.

mas concordo que a solução é de facto ler o mais possível, conhecer os diferentes pontos de vista de forma suficiente até podermos decidir com qual concordamos ou alinhamos... isto ecoa um certo post que um certo dia escrevi sobre as virtudes de haver jornais «deliberada e abertamente» de esquerda e o mesmo aplica-se para os de dta. O problema é que mtos o sao de forma velada e ao nao assumirem a sua linha política perante os leitores estao a enganá-los, passando por jornais supostamente «imparciais».

um bj, joao. gosto que gostes de pensar e discutir estas coisas.

e um bj ao causador de debate, claro

João Santiago disse...

Gostaria de entrar neste 'debate', com uma partilha do que vejo pelo país onde me encontro.

Os media estão todos a favor do governo (não falemos de imparcialidade sequer) e os jornalistas acabam por tornar-se os próprios humoristas, fazendo uns telejornais que apenas dão vontade de rir.

Refiro que qualquer telejornal de qualquer canal colombiano 'mete a TVI a um canto' em termos de notícias ridículas e formas de abordar acontecimentos.

Remark
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Rita: Por exemplo, em Portugal temos o jornal Avante que não tende para a direita. E o DIABO também não. Tende para o fundo.