Tony Judt , um dos meus intelectuais e historiadores preferidos, faleceu há umas semanas, no dia 6 de Agosto. Em primeiro lugar, deixem-me saudar, por um lado, o destaque que a sua morte teve na imprensa escrita, e lamentar a falta dele na restante. A morte de um dos pensadores mais importantes do nosso tempo, ainda por cima um que dedicou o seu esforço mental a fazer-nos compreender questões tão importantes para nós como o futuro da União Europeia, merecia mais.
De certo modo, este defeito é apenas o reflexo de um dos alertas que Judt nos deixou: o intelectual, e falo do verdadeiro indagador de respostas, é não só uma espécie quase extinta, mas também uma voz no deserto. Pseudo-intelectuais, que confundem inacessibilidade e palermices com verdadeiro esforço de pensar e gosto, pululam por aí, distorcendo o significado desta função. Judt soube ser sempre um, com toda a classe: polemista como poucos, sem medo de afirmar à boca grande o que se comentava à bica pequena, a sua crítica à política de Israel tornou-o num judeu muitas vezes apelidado de anti-semita, como se tivesse um ódio à sua própria origem. Ele, melhor do que ninguém, sabia do que falava: um sionista convicto, a sua vida num kibbutz durante a Guerra dos Seis Dias abriu-lhe a pestana para a realidade. Ao contrário de muitos intelectuais actuais, ele viveu o que pensava. Parecendo que não, isso faz a diferença.
Na memória futura, no entanto, ficará Tony Judt, o historiador. A sua cabeça, o último bastião atingido pela esclerose lateral amiotrófica que veio a vitimá-lo, continha uma das mentes mais ágeis do nosso tempo, e uma enciclopédia permanente. Isso, e uma rara habilidade para escrever História, explica a excelência da monumental obra "Pós-guerra - História da Europa desde 1945", que será durante muitos anos o livro definitivo acerca do tema. Mesmo que o seu tema predilecto fosse a intelectualidade francesa do século passado, Judt revelou-se um historiador político, como poucos. O seu outro livro traduzido para português, "O século XX esquecido" contém vários ensaios sobre tudo, desde Hannah Arendt, passando pelo caso de Alger Hiss e acabando no declínio da esquerda norte-americana no pós 11 de Setembro.
Longe de ser um espectador, Judt fez viver a sua crença de que o intelectual é interventivo e lutador, e usa o seu ponto de vista como algo de atingível e real, por muito utópico que possa parecer. A sua defesa do Estado-Providência, o modelo de governo que preferia, devia ser a leitura de cabeceira de Pedro Passos Coelho. Sim, caro Tony: Portugal não tem George W. Bush, mas se fosses dos nossos, tinhas aqui muito pateta sobre o qual discutir. Se intelectualmente, é outra questão. Mas de qualquer forma, até Estaline fica melhor na fotografia quando o descreves.
2 comentários:
...fica a obra porém o reconhecimento fica por se cumprir.
boa homenagem.
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