quinta-feira, agosto 13, 2015

Mero ar



Um sopro de palavras, porque ele não falava: lançava para o mundos letras de mãos dadas, e quem ouvisse que tomasse conta. Sentia-se assim e na propriedade de quem determina o que diz, era a pessoa menos responsável. Perde-se o controlo do pensamento, das ideias e da sua expressão, e perde-se tudo, de facto. É-se um mono simples, hirto como uma estátua, menos expressiva, mas suja do que lhe cai em cima, não de aves, mas sim da própria rotina de cada dia, do despertar/adormecer que abre e encerra as aventuras de 24 horas em tédio. Se saber o que diz, sem saber o que exprime, desconhecendo tantas vezes o que é. Num momento, senta-se e quer dividir toda esta dor em partes, mas quando dá pela sua tribuna, é um buraco voraz dentro de si, que lhe puxa tudo e lhe devolve ainda mais o que já estava acamado no leito subterrâneo de um oceano em forma de planície rochosa. As ondas não batem nas rochas: as ondas são rochas ainda maiores do que as pedras, e cada uma devolve-lhe o que recusa. Como se te dessem o par de meias mais foleiro de todos os Natais passados e futuros, mas em oferta diária. Por isso sopra palavras, por medo. Se as disser com intenção podem quebrar-se na sua língua, estalar e rebentar-lhe a boca em aftas. Proíbe-se de dizer o que quer, abestém-se de eleger o que deseja, e abdica de uma ditadura do seu próprio querer, da vontade, do fogo que lhe estoura todos os tecidos do corpo cosidos em pauta musical.

É ténue, a palavra, e mais ténue ainda cada olhar vazio na parede. Mas pelo menos, ainda está de pé, pelo menos por fora. Porque quando sopra palavras, é estendido na horizontal, sem ar que o eleve, sem levitação ou planador: assim mesmo, horizontal como uma frase, mas sem nunca amontoar a um texto.

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