segunda-feira, agosto 03, 2015

Palavras num tempo sem tempos verbais (que se arrastam e tentam ser algo)



As gotas de chuva são ponteiros do meu tempo. Cada uma delas um segundo mais que penso em ti, do lado de fora da janela. Na distância atrás da linha das casas, há muito espaço, mas sei que, na tua cadeira, és coberta por um véu de morrinha quando as nuvens te negam um sorriso. Imagino cada gotacomo um pouco de ti, e que esta pequenina morte que me enterra às vezes pode ser evitada por um analgésico visual, ou simplesmente fantasminhas brincalhões da minha cabeça, formados pela gotas de chuva que te trazem. Tic tac, splish, splosh, e a tua face reflectida na penumbra dos dias, contornando tudo o mais que torna as sextas em longas segundas. A chuva hoje é o meu caminho até ti: por entre a água que cai, a minha mão passa seca e encontra a tua, sem hora marcada, mas com tempo infinito. Não é feliz, não é triste, mas é o que mereces e o que quero dar. Oferecer-te, em cinco dedos, muitos mais do que números e dígitos digitais. Quero oferecer o meu coração para que haja espaço suficiente para esse negrume se espalhar e poder assim diluir-se e desaparecer mais rápido. Quero ser um segundo tu, quero ser mais espaço para que te sintas bem, te sintas em casa, para que atravesses esta chuvada impermeável e entres no sábado como quem chega e se senta a uma lareira, aconchegada, quente, protegida. Num sofá que é o teu mundo, numa manta que são os teus livros, a música e tudo o mais que te habita.


E depois, a minha mão pode voltar a mim e nada importa mais, desde que te saiba bem. A tua felicidade é um farol para o mundo em redor, e não quero que se apague. Tudo o mais é água que escorre, na verdade, e que a terra faz sua. Tu acima de tudo, e o céu é apenas uma comichão de miragem. 

Sem comentários: