Tudo isto pesou e me contrariou o instinto, levando-me a abdicar de pequenas vitórias que vinha conseguindo. Não tenho espírito de emigrante, sou demasiado acomodado , inflexível e falta-me a agilidade e estoicismo que tanto nos caracterizam como Portugueses, um povo de emigrantes. Ainda assim, tenho feito um trabalho de sapa nos últimos anos para me demolir indo contra mim e como tal, aqui vos escrevo de Colos, pequena vila alentejana (pequena é uma palavra mais operativa do que alentejana), onde a pasmaceira é não só um lema como um desígnio municipal a ser inscrito no brasão. Como descrever? Bem, imaginem a longa recta de alcatrão com duas curvas no final e casas brancas baixas, atarracadas, apertadas numa guarda de honra de tijolo e adobe: é isto. As mercearias chamam-se drogarias, o campo de jogos está invariavelmente vazio, as ruas de empedrado, as cegonhas são drones que patrulham em voo rasante e longos bicos a planície antes de pousar nos ninhos. Acessos entediantes, por entre montes alentejanos e no mapa, Colos fica equidistante de Odemira e Milfontes e antes que pensem que sim, que finalmente há animação e civilização, o meu conselho é que coloquem tudo em perspectiva: qualquer uma delas faz Coimbra parecer Nova Iorque e Tóquio em fusão; e já agora, a rede de telemóvel é tão estável quanto a saúde mental de Madonna e o sinal de Internet tem a força de um jogador de futebol quando sente um leve toque nas costas. Viver por aqui é um exercício de ascetismo e isolamento, como se me entregasse a um retiro espiritual de reavaliação da minha vida e talvez precise disso, de cortar com algumas árvores que se enraízaram em mim, podar outras, ignorar umas quantas e reposicionar-me. Esquecer pessoas, dar a outras o espaço que merecem e decidir como organizar as restantes,
Aqui também encontrei uma rotina boa e uma função, o prazer de, quando em vez, espantar os alunos com conhecimento, colegas disponíveis e relaxados, boa gente que quer receber e fazer-nos sentir bem e também o prazer do quotidiano, guiar em rectas intermináveis com boa música e o meio de nenhures abraçando-me e dizendo que se calhar vai tudo correr bem, que de duas semanas virei a casa e estarei com os meus, que lá por baixo também há vida, que se calhar viver a novidade é tão parte da vida como as cabeçadas. Quero acreditar em tudo isto; mas também gostava de não confundir a minha casa com as restantes 5 iguais que estão ao lado. Por isso, um passo de cada vez.
1 comentário:
" porque me tem custado, cada vez mais, viver na vergonha de ser e estar desempregado enquanto toda a gente em meu redor tem um emprego e uma vida feita, filhos e companhia, uma ideia definida daquilo que faz e quer enquanto eu morrinho dentro de mim..." - eheheh, estás a precisar - certamente - de outras lentes. nem estar desempregado é vergonha, nem os outros que te rodeiam, porventura, têm esse idilio de vida.
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