terça-feira, junho 16, 2015
Descobrindo as diferenças
Nas mãos, uma pedra, imperfeita e áspera, centeninhas de recantos não burilados, inacabados. A pele preenchia-os com a energia própria do calor do corpo, e num momento ele conseguia sentir tudo, até a ventania lenta que, uma vez por festa, faz festinhas no topo das árvores. Sentiu-se em contacto com tudo o resto, e num olhar, pensou encontrar o sentido não da vida, mas pelo menos de como a vida se desmonta, e baralhando volta a dar-se em peças inteiras bem diferentes. Na plenitude, pensou: porque nos escolhem e porque escolhemos? Porque é aquela mais do que a outra, e qual a diferença entre as mesmas dez pessoas que gostam do mesmo, que fazem o mesmo? O que nos leva a, sentados na vida, nos agarrarmos a uma e deixarmos as outras nove? Se os átomos são os mesmos, se a carne é igual em todos, se os beijos que guardamos no intervalo entre cada poro recebem o mesmo calor, a mesma intensidade, o mesmo resguardo, que impulso diabólico leva o pulsar de gigante vermelha a fixar-se em órbita daquele buraco negro especial que nos suga tudo, e não nos deixa nada a não ser a impressão de que somos maiores do que o Universo na pequenez do mundo frágil e indefeso que recebemos de herança? Aquela pedra, ali à sua mercê, era ele, nas digitais posses dos caprichos incompreensíveis do corpo e da mente, de tudo o que de misterioso há entre ambos, e ainda de outros primos afastados consanguíneos.
Nem todos são iguais, e se não era esperto para entendê-lo, algures em si um posto de decisão, pouco fiável mas tirânico, escolhia e sabia bem dos motivos. Há peles mais confortáveis do que outras, e lábios que são berços que embalam e não camas de pedras. Olhos feitos aparições que ordenam tudo, perfilam o mundo e trazem a uma cama as dimensões do planeta, aos cabelos o aspecto de um avião que percorre infinitas viagens enquanto as pupilas se colam na retina, e para lá disso, e abandonam os corpos que afinal são posse e consentimento, e prendem de tal forma que se pode viajar não parado como constrangido, e ser livre ainda assim. Para lá do que é comum, e das mesmas proteínas e substâncias que nos tornam filtros de um deus menor, há uma centelha minúscula que ardendo, é mais do que fogaréu. Na pedra, viu tudo isso, tentou entender o que existe, e não foi bem sucedido, mas algures em si, sentiu que se procurasse, encontraria então quem fizesse do andar um lençol de algodão, e dobrá-lo-ia para não se amarrotar. Talvez, num dia qualquer, numa altura das outras, e como se, por outro lado, conhecendo a vida lhe tirara não só matrícula como as matizes da íris, lançou a pedra para longe e fez dela um estafeta mensageiro, com esperança de que voltasse não na volúpia da brisa, mas talvez na constância dos regatos, e quis ter vontade de se sentar junto ao rio lá em baixo, esperando por boas novas, por camas e olhos e pele, por um riso que lhe atravessasse os ouvidos com a missão de lhe bater palmas por ter nascido, e dar-lhe finalmente uma razão para se levantar de manhã e poder olhar o mundo com a altivez do que se sentem desejados e com um propósito,
Não o fez. Ganhou na mesma. Duas semanas depois, encontrou uma outra pedra, mas festa estátua, insuflada de vida, espantosa como lhe criava múltiplos atalhos para ser ele, e ainda assim se reinventar sói pelo prazer de lhe dar 40 homens para amar encerrados num. Mas esse catavento é para ser virado numa outra nortada.
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