A questão do aborto, a propósito do referendo do próximo dia 11, tem agitado a sociedade portuguesa nos últimos tempos. É um bocado parvo que assim, seja, proque tem o país tantos problemas para resolver e anda-se a discutir algo que, a meu ver, não tem qualquer importância, porque a lei actual é estéril: os crimes dão-se, mas as punições não aparecem, por isso qual a diferença entre isto e o aborto ser despenalizado? Quase nenhuma; e não me venham com a história da vergonha, porque em terras pequenas tudo se sabe. Se a mulher não for ao tribunal, mais tarde ou mais cedo, circulará o boato de que abortou, o boato transforma-se em facto, o facto em certeza, a certeza em fama duradoura. Acho que todos vocês sabem como funcionam os meios restritos.
Um dos campos onde toda esta problemática tem lançado sururu é o do humor, com o quarteto Gato Fedorento a estar no centro da discussão. Não vou gastar palavras a defendê-los, porque eles não precisa de ajudar para se defenderem. Mas toda esta situação me levou a pensar sobre o conceito de sentido de humor, que muita gente diz ter. Este conceito, neste caso específico, liga-se ao de liberdade de expressão. Convenhamos: um humorista não é um jornalista e mesmo que fosse, é antes disso um cidadão. Por isso, se quer dar uma opinião num texto seu, ou num sketch, dá e acabou. Que temos nós a ver com isso? Malta chico-esperta defende-se com "a RTP é paga cm o nosso dinheiro". E então? Antes do "Diz que é uma espécie de magazine", o professor Marcelo Rebelo de Sousa tem o seu espaço, onde defende o Nâo. Alguém o critica? Negativo, e acho que bem que não critiquem. Duas opiniões diferentes podem coexistir na mesma estação de televisão. É a chamada pluralidade de opinião, um conceito essencila num estado democrático. Li algures que sub-repticiamente, a RTP está a passar a mensagem socialista do Sim no referendo. Eu tenho uma opinião diferente: imediatamente a seguir a um "Prós e contras", onde a interrupção voluntária da gravidez foi o principal tema, a RTP passou o conhecido filme "7 noivas para 7 irmãos", um bonito imbróglio de amor e casamento que só fica resolvido quando nasce uma criança e as 7 noivas podem casar com os 7 irmãos. É subtil, claro, mas está lá.
P.S: Uma paróquia de que não me recordo o nome passou a crianças de escolas folhetos com uma bonita carta de um bébé abortado (dando a entender que o aborto traz, em si, crianças sobredotadas ao mundo), acusando a mãe de dedo em riste e perguntando, entre outras coisas: "Como é que deixaste que me cortassem aos pedaços e me atirasem para um balde?". É bonito. Exijo à mesma paróquia, como cidadão interessado, que dêem direito de resposta à criança que acabou por nascer, mas é hoje em dia espancado pela avó, violado pelo padrasto e ande na rua a roubar e a consumir drogas. Acho que devemos todos assumir a hipérbole.
sexta-feira, fevereiro 02, 2007
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3 comentários:
Só um pormenor acerca da brilhante imitação (nunca pensei que fizesse tão bem) do Marcelo pelo RAP.
É assim, eu compreendo críticas (apesar de ainda não as ter ouvido). Epá, diga-se de passagem que os gajos tentaram ridicularizar a opinião do Marcelo. Ora, apesar de achar que não é a melhor solução (porque quer meter o lixo debaixo do tapete), a opinião também não é ridícula, digamos a verdade. Ora, eu não acho muita piada ao gajos quando começam a dar as suas opiniões, não é isso que gostamos neles. Eu fui incapaz de rir durante o sketch (e até o conseguiram com o meu pai).
É assim, eu sei qual é a opinião dos gatos acerca do Salazar, Santana Lopes e Pinto da Costa (e até devo concordar na sua maior parte), mas não quero que eles metam essa crítica em sketchs. E não o meteram nos "Médios Portugueses", "Alguns minutos" e "A história (...) Pinto da Costa". E fartei-me de rir quando vi. Dizem-me agora: não deram a sua opinião nesses sketchs? Não, como já disse RAP, eles limitaram-se a transmitir para o sketch a opinião pública. Ora, não foi bem isso que fizeram com o Marcelo.
Mas a imitação estava bestial. ;)
«É um bocado parvo que assim, seja, porque tem o país tantos problemas para resolver e anda-se a discutir algo que, a meu ver, não tem qualquer importância, porque a lei actual é estéril» - estéril...hum, no mínimo uma infeliz escolha de palavras. estéril significa não produtivo e este assunto é produtivo. tem efeitos. muitos.)
«os crimes dão-se, mas as punições não aparecem, por isso qual a diferença entre isto e o aborto ser despenalizado?» - a diferença - mas depois falamos melhor disto - é que não tens uma câmara, varios microfones e populares a gritar à porta do tribunal 'vadia', 'assassina', e por aí fora. A diferença é que podes fazer um aborto, ou melhor todas as mulheres que assim o entenderem e não só as meninas bem, com todas as condições médicas, psicológicas, num hospital ou numa clinica, sem correr risco de teres uma infecção, uma complicação maior, sem correres o risco de morrer. A diferença é que já não és maltratada se fores a um estabelecimento do SNS com os sintomas idênticos a quem fez uma IVG. A diferença é que podes escolher.
Em relação ao facto de a lei ser estéril... bem, a escolha de palavras não é infeliz. Se e lei não fosse estéril, daria à luz, ou seja teria efeitos, resultados. O que não acontece. Até hoje, nenhuma mulher foi condenada legalmente por ter praticado aborto em Portugal. O assunto em si é que não é estéril, porque quantos mais argumentos puxamos, outros mais ficam por dizer. Adoraria que todos os problemas em Portugal fossem discutidos com esta intensidade e esta minúcia. Mas enfim, o orçamento de Estado não é tão propenso ao escabeche...
Quanto ao segundo ponto, realmente tens razão. Há uma diferença enorme entre fazer a interrupção voluntária da gravidez numa sala de operações e numa mesa de talho (aqui especulo, porque nunca etsive presente num aborto clandestino...). Se bem continuo a achar que a mulher contiua sujeita à maledicência e escrutínio das pseudo-autoridades morais, mas a um nível local. Eu sou assim: não confio na bondade inata das pessoas, e não é o chamado sigilo médico que me vai fazer confiar... Já agora. que história é esta de banalizarem o aborto, dando a ideia de que "Eh pá, tive feriado a Matemática! E se fosse abortar? Parece que é giro!" Quando eu julgo que sou abusador nas piadas, vejo que a realidade é muito abusadora no seu mau gosto.
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