segunda-feira, novembro 07, 2005

O universo joga aos dados...





Eu estava sentado no chão, a falar com a pessoa ao meu lado. Já nem me lembro sobre o que era, mas por muito importante que fosse o assunto, a sua pertinência desapareceu quando ela se chegou junto de nós,me tocou no ombro, e sorrindo atrapalhadamente, me perguntou num inglês razoável se que queria ir faezr um pão com ela. O cínico dentro de mim pensou primeiramente que era uma piada, e de seguida que certamente ela se enganara na pessoa. Estive tentado a dizer-lhe "desculpa, mas deves estar a confundir: as pessoas interessantes estão do outro lado do edifício", mas contive-me. Num acto que mais tarde eu classificaria como a maior parvoíce justificada que alguém cometeu, disse que sim. Levantei-me e tentei meter conversa com ela.

Só aí reparei que ela já me tinha saltado à vista. Pensando bem agora, se ela não tivesse, eu devia ser cego, ou então ter péssimo gosto em raparigas. Só não sabia o nome. Perguntei-lhe então, e ela respondeu. Ri um bocadinho, e ela perguntou porquê. Respondi-lhe que era um diminutivo de nome de emigrante, na minha língua materna. Ela também achou piada e ripostou, dizendo que o meu era comummente dado aos cães do país onde ela vinha. Engraçado, pensámos. No entanto, se calhar já desconfiávamos que a nossa estranheza não começava sequer nos nomes que nos tinham sido postos pelos nossos pais...

E foi assim que fizemos um pão. Não tenho ideia de ter ciado bem feito, mas certamente que fermentou o que crescia entre nós. Se calhar, não devia ter crescido, ma shá coisas que não se podem de todo impedir. A partir desse pão, conversámos cada vez mais, rimos um com outro, trocámos alguns olhares e aprendemos que víamos no outro as coisas que queríamos acreditar que ele tinha, e que nós gostávamos. De facto, inventámo-nos um ao outro, e foi nessa invenção que nos aprendemos a sonhar.

Daquele pedido culinário, acabámos defronte um do outro, numa estação, a perguntarmo-nos o que raio se tinha passado. Embora ambos soubéssemos falar inglês, sabíamos que não havia idioma algum que pudesse traduzir tudo o que víamos um no outro. Por isso, respondemos da única maneira que soubemos: abraçámo-nos. Nos segundos que demoraram esse abraço, apercebi-me de quão frágil ela era, e de quão pequenos eram os meus 1,87 quando se viam envolvidos na sua saudade; e foi então que me senti frágil. Como se ela, simplesmente por me abraçar, tivesse ganho o poder de me ferir simplesmente por respirar. Podia arrepender-me, mas não: senti que por fim era alguém. Quanod parámos de nos abraçar, ela beijou-me na face e falou por detrás dos óculos: "Goodbye. I hope we can see each other again." Eu, que normalmente falo pelos cotovelos, só disse: "Yes", e tudo o que não disse em palavras, ela leu-o nos meus movimentos nervosos. Sorrimos ambos um para o outro. Enquanto ela entrava no comboio, eu queria ir atrás dela, mas fui palerma e fiquei especado. Assim, o comboio arrancou e ela veio à janela dizer-me adeus. Eu respondia-lhe; e ela partiu.

Nesse momento, um rapaz na estação ficou com um ligeira impressão na barriga, como se algo andasse para cima e para baixo apenas pelo pronunciar de um simples nome, ao mesmo tempo que tentava enxguar uma alma salgada de lágrimas. Esse rapaz sou eu.

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