quarta-feira, julho 15, 2009

A loucura 1


Ter alguém a berrar ao nosso lado nunca é uma boa experiência, principalmente se esse alguém consegue imitar na perfeição uma sirene da Lisnave a dar o toque para almoço. Era o caso daquele homem encorpado, que parecia estar zangado comigo pela simples razão de me encontrar sentado num Ferrari prateado. Claro que pode ter sido simplesmente pelo facto de o Ferrari não ser meu; e de o veículo estar enfaixado na zona de restauração do centro comercial. Parecendo que não, são dois motivos para chatear.
Queria explicar-lhe como tinha ido ali parar, mas será que uma história que me envolve e à equipa de rugby da Académica a escutar Ace of Base, improvisando um tango argentino, pode ter credibilidade? Estou em crer que não. Por isso, saltei do carro e tentei avançar até uma parte da história que parecesse minimamente lógica.Isso significava esquecer a corrida de morsas no Mondego, o geoaching de ceroulas na zona de Santa Clara e a caçada a um unicórnio por parte de três turistas irlandeses a quem corria whisky nas veias. Um deles, de facto, era bastante parecido com Bono Vox, mas só quando a luz do sol o iluminava do queixo para cima.
Talvez devesse começar pela Diana. A Diana estava perto de ser a rapariga mais feia do mundo, e só não o era, porque ainda há quem acredite que as lendas de Yeti fêmeas são verdadeiras. Ela era o tipo de pessoa que tinha quase tudo o que queria da vida: um marido, que dirigia a Acapo; um emprego de sonho, como membro do corpo de intervenção da PSP, e uma casa, que não tinha espelhos. Faltava-lhe apenas uma coisa para ser feliz: ver um unicórnio. A culpa deste desejo estranho era da mãe, que lhe respondeu à sua pergunta "Mãe, algum dia serei bonita?" com a clássica "No dia em que os unicórnios cantarem o "My way" do Frank Sinatra. "Era aí que entravam os três irlandeses, que se especializaram em capturar animais imaginários (ficaram célebres quando apanharam um ponta de lança decente para o Benfica). Porque tinham vindo os distintos caçadores a Coimbra para a empresa, não sabemos, mas certamente terá a ver com a quantidade de bois que há na Universidade de Coimbra.
Como não encontraram unicórnios, restou-lhes tentar disfarçar outro animal, e o escolhido foi a morsa, que tem óbvias parecenças com os cavalos, contanto que ambos estejam dentro de caixas negras na altura da comparação. Eu vinha da corrida de morsas. Estava lá, porque sou um profundo admirador da nobre elegância destes animais. Por outro lado, ainda acredito que há galinhas com dentes. Os irlandeses tentaram convencer-me a alinhar neste esquema e aconselhei-lhes falarem com Lord Trocaopeice, um dos grandes criadores de morsas de ambos os lados do Trancão. O gentleman ficou ofendido com a sugestão, pois nunca as morsas eram parecidas com cavalos. Escaravelhos, no máximo. Sentia-me preso num livro de Kafka, mas isso talvez se deve ao bafo dos três irlandeses conjuntos, que me fez perder a consciência antes que estes dessem uma bordoada no Lord e roubassem uma morsa. Quando acordei, estava no meio de um campo de rugby e acabara o treino do dia. Aparentemente, estava na hora de "Assuma a sua homossexualidade" e daí o tango argentino ao som dos Ace of Base. Quando um calmeirão que parecia fazer dois do Triple H começou a olhar para o meu rabo com a mesma devoção que quero dedicar à Scarlett Johansson a fazer dança do ventre, decidi que não estava para servir de touchdown, e pus-me a correr dali para fora. Saltei para o primeiro carro que apanhei, um Ferrari prateado, e pus-me a andar.
No entanto, ainda sob o efeito do bafo alcoólico irlandês, andei apenas alguns minutos antes de perder o controlo do veículo, para entrar centro comercial dentro. Depois de contar isto ao segurança, este gargalhou e conduziu-me à Natura, onde estavam a exibir um unicórnio. Senti chamarem-me e qual não foi o meu espanto quando me viro e vejo uma mulher igualzinha à Scarlett Johansson. Era a Diana. Enquanto o unicórnio recomeçava a "New York, new york", fiquei ali à espera que a Diana, agora contente da vida, e desejosa de iniciar uma carreira como hospedeira de bordo de helicópteros, fizesse a dança do ventre. Foi então que me senti abalroado por aquilo que se assemelhou a um bloco de granito a deslizar pela encosta glacial do monte Branco, mas que era simplesmente uma morsa. Quando recuperei a consciência, o meu nariz tinha inchado tanto que eu próprio parecia um unicórnio. Os três irlandeses lançaram-me uma rede, meteram-me um capuz na cabeça e levaram-me.
Agora, estou numa feira de aberrações de Carcavelos. Não é mau emprego, mas fico sempre a pensar no que teria acontecido se me tivesse demorado mais uns minutos no campo de rugby.

2 comentários:

Anónimo disse...

Esforça-te mais. Os ultimos post t~em sido muito aborrecidos. Tu consegues..

JP

luminary disse...

É uma situação de proporcionalidade directa relativamente ao feedback... Porque eu sei que consigo...