quarta-feira, julho 24, 2013

Having the time of my life, watching the clock tick


Uma boa vida é feita de equilíbrios, e o balanço de lastro existe muitas vezes fora de nós. No meu caso, que sou alguém com uma tendência para a melancolia, espaçada por acessos de "WTF", preciso de procurar no exterior algo que impeça que a melancolia alastre como uma colónica de bactérias, e me impeça de avariar, de quando em vez. Encontrei o meu lastro em 1998, numa cassete emprestada por um colega de secundário cuja fixação por bandas de punk pop ainda se mantém hoje. O álbum da cassete, "Nimrod", entrou-me no ouvido com a violência inexplicável de quem, pensado ser um intelectualóide acima de gostos populares, ignora que é naquela idade que os gostos são verdadeiramente formados, e que o nosso cérebro sabe instintivamente o que nos forma, e compõe, e constrói. No meu caso, descobri que uma dessas peças agrupava três rapazes de Oakland, Califórnia, fãs de trocadilhos de sexo e drogas, e que encontraram precisamente nesse gosto uma via verde para se baptizarem depois de uma noite de charros. Falo, como adivinharam aqueles que me conhecem, dos Green Day.

Nunca é fácil fazer perceber às pessoas porque gosto de Green Day. Devo ter dez anos a mais para continuar a gostar deles, como se a partir de uma certa idade tivéssemos de abandonar o que para nós faz mais sentido. É uma tolice. Ou então, como se chegado a um certo ponto de erudição, descer ao nível dos três acordes fossem uma despromoção. Outra tontice. Há várias razões pelas quais a música que esta banda faz me preenche, mas a principal é a mais simples de todas: faz-me sentido. Os Green Day permitem-me descer à realidade quando estou demasiado perdido na complexidade dos meus pensamentos, e preciso de um simplificador. De algo que me desligue tudo o resto para me poder concentrar naquilo a que a vida se reduz. Aliás, os meus gostos mais refinados e os meus gostos mais simples têm algo em comum: são sempre questionados, mas por pessoas diferentes. Ora, isto leva-me a crer que os nossos gostos, para serem bons, têm de ser nossos, independentes da opinião alheia. Há sempre um motivo ara questioná-los, mas desde que seja nosso: em tudo o resto, como diz o meu amigo Amrstrong, "I wanna be the minority".

É por isso que, sempre que o trio surge por este cantinho marinheiro, eu navego rumo à excitação de vê-los ao vivo. Não é grande o sacrifício, mesmo que se dê dinheiro para ver outras bandas que até nem se aprecia: os Green Day são uma das melhores bandas ao vivo que conheço, um carrossel portentoso de acção, movimento e o contrário de crenças modernas de que a melhor maneira de curtir um concerto é abanando a cabeça e parecer irónico. Num concerto desta banda, há festa rija, e ninguém está parado, porque não pode, a estimulação é constante e não há aquela pausa, nem o aquecimento: é-se lançado para um passeio dos alegres como aula de cardio, mas sem música irritante. Toda a banda é excelente ao vivo (Mike Dirnt, aguerrido e com sentido de humor; Tré Cool na justificação plena de que as regras sociais só servem para quem não tem a imaginação de existir por si mesmo), mas é em Billie Joe Armstrong que o espectáculo encontra a sua expressão máxima, como um cicerone maior do que tudo, sempre elogioso e caprichoso, invectivando o público, exigindo atenção, chamando espectadores a brilharem no palco. Há quem atire barcos insufláveis e abra garrafas de champanhe, mas os músicos a sério sabem o que é trabalhar uma audiência, e Armstrong trabalha-as há 20 anos. O concerto não foi perfeito... Faltaram temas essenciais ("Brain Stew" é sempre um momento de catarse, e não acabar com "Time of your life" é uma bofetada na cara) e a concentração demasiada em Dookie roubou outros potenciais momentos numa noite que foi até de memórias menos esperadas. Mas isto são queixas de um fã, São aqueles que mais vivem os momentos; e no entanto, depois de acabar o concerto a dançar um slow, não posso deixar de voltar ao início: a vida é feita de equilíbrios, e nada como, depois de me terem acompanhado em fases de secura feminina, proporcionarem-me a coragem para assumir que sim, estou aí ara as curvas e cheio de truques novos. Tal e qual como os rapazes californianos. Obrigado, e como disse da úlitma vez, a próxima vez que voltarem já vem tarde. 

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