quinta-feira, dezembro 15, 2005

Porque é que somos o bicho mais inteligente

Se há momentos em que o timing é inimigo de Portugal (porque o é: Santana Lopes, por exemplo, teria sido figura de proa nos tempos idos do Barroco português, nos séculos XVII e XVIII, com todo o fausto, loucura e deboche; Paulo Portas já teve o tempo em que podia ter enveredado pela carreira eclesiástica, sendo certo que hoje seria Papa e nos teria livrado do seu arrepiante consulado à frente do PP; e homens e mulheres como José Cid, Manoel de Oliveira, a falange de boys do PSD e do PS, Vera Roquette e boa parte dos dirigentes de futebol portugueses mostram a ausência de um sentido preciso de timing de retirada), hoje foi um deles. Não é que no dia em que a ONU publica uma estatística que a todos orgulha, como é a do decréscimo da mortalidade infantil em Portugal, surge a notícia de que um bébé de 50 dias deu entrada no Hospital Pediátrico de Coimbra com sinais de abusos físicos? O espírito choca-se e treme; e quando se pensa que a coisa já é má, surge que afinal o bébé fora vítima de abusos sexuais. Mas a minha alma fica completamente parva quando leio que a criança fora atendida anteriormente por 4 vezes nos hospital de S. Teotónio de Viseu, por razões semelhantes, e que a Comissão de Protecção de Menores recomendara que o bébé ficasse à guarda da avó materna, debaixo do mesmo tecto dos pais, ele com 22, ela com 20.
Claramente estamos a entrar num mundo à parte e em que qualquer intelectualização deste acto, uma proeza só possível ao alcance da psiquiatria do século XX, não pode intervir. O que terá levado duas pessoas a cometer tais abusos sobre tão tenra alma humana? A Natureza? Sim, há animais que comem as crias. Mas esses não possuem esse dom tão belo que é a inteligência. Bem, pensando bem, nem os pais deste bébé, o que os coloca em pé de igualdade... Mas os bichos comem as crias porque têm fome; e que eu saiba, não lhe andam a dar porrada durante semanas antes de as comer: abocanham-nas e pronto! Parece horrendo, mas é a fome que aperta. Na civilizaão ocidental, há o McDonalds, que destrói sistemas digestivos, mas resolve este género de problemas.
Podem os pais alegar que o bébé os incomodava. Realmente, o choro é uma coisa chata. Já li sobre casos de gente que para calar os seus bebés os atiraram da janela ou simplesmente os meteram dentro do microondas. Ligado... Por isso, bater pode parecer a melhor solução, mas além de sujar a carpete (o que para a família média portuguesa é sempre um incómodo, bem superior ao espancar de uma criança...), poderá fazer a criança berrar de goelas bem abertas. Qualquer pessoa minimamente inteligente sabe que bater em alguém só causa dor e no caso das crianças, choro. Esperem, eu disse pessoas inteligentes. Esqueçam... Bolas, este caso parece realmente indefensável!
Quanto aos abusos sexuais... Bem, podem-me chamar limitado, mas eu até compreendo o impulso que leva homens a violar mulheres. Já a violação de bébés vem mostrar, de forma inequívoca, que Portugal é o pioneiro definitivo em práticas pedófilas e que os arguidos do processo Casa Pia eram claramente uns retrógrados, habituados a géneros de vida sexual claramente ultrapassados. Claro que, no meio de tudo isto, alguém, de preferência os pais da criança ( se partirmos do princípio que conseguem, pois para se explicar algo, é preciso alguma sageza e inteligência, que, como já se viu, não moram aqui) como é que alguém tem prazer em violar um bébé de 50 dias. A sério, gostava de saber. Têm vidas sexuais frustrantes? Eu também, pá, e no entanto não me lembro sequer de alguma vez ter pensado nisso. Carnes macias? Não sei, não gosto de fiambre; Acham sexys bébés em fralda? Nesse caso, sugiram que mudem a prescrição dos vosso óculos.
Chegados aqui, a conclusão, que parecia dúbia, confirma-se: NÃO HÁ JUSTIFICAÇÃO! Sinto por isso curiosidade em verificar algumas coisas, de futuro:

1 - Porque é que foi precisa uma quinta ida ao hospital de Viseu para os pais desta criança terem sido acusados de maus tratos infantis? A desculpa do "Caiu na escada" só devia ter resultado umas duas vezes...

2- Irá o advogado alegar insanidade mental? Por muito que me agrade, é um coisa demasiado óbvia e lembremo-nos que para se ser insano mentalmente, é preciso possuir faculdades mentais...

3 - Será que alguém se irá lembrar que por um caso que nos choca em Portugal, há dez ou vinte diriamente noutros países cujo nome nem conseguimos pronunciar? Seria interessante ver se haveria uma revolta tão pungente se fosse alguma das crianças chinesas maltratadas apenas pelo facto de terem nascido do sexo feminino...

4 - Quem terá coragem para vir a público apelar à confiança nas instituições? Eu não, de certeza!

5 - Pena de morte para este caso, como há quem tenha sugerido? Claro que não: porque pouparíamos esta gente a abusos sexuais na prisão e uma vida inteira de achincalhamento público?

6 - No fundo disto tudo, há uma coisa boa: a memória das crianças só começa a formar-se em pleno aos 3 anos. Por isso, quando ele crescer, falará com os amigos sobre quando aprendeu a andar de bicicleta ou do boneco de plasticina que fez na primária e não daquela vez em que os pais foram presos, por terem a mão pesada. O corpo humano é uma máquina a que agradecemos poucas vezes...
Claro que quem lê isto espera que eu avance com uma explicação cabal. Durante uns momentos, preferi acreditar na Estupidez; noutros, na Maldade. No fim, lembrei-me que afinal tudo isto só pode desembocar na falta de cultura do povo português e a sua falta de leitura. Se tivessem lido Fernando Pessoa, saberiam que "o melhor do mundo são as crianças". Claro que me chateia saber que ainda é preciso recorrer a citações para nos vergarmos à evidência de tal verdade, mas para não me deixar abater pelo horror do mundo, é a explicação que quero reter na cabeça.

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